segunda-feira, 24 de junho de 2013
PACIENTES DECIDEM ACAMPAR EM ESPERA DE ATENDIMENTO NO HOSPITAL DO CÂNCER
Por Jairo Carioca
José Vidal é natural da cidade de Tarauacá, de onde veio com a esposa, Clemilda Silva, no dia 27 de março, para o Hospital das Clinicas (HC) em Rio Branco, através do Tratamento Fora de Domicílio (TFD). Clemilda conta que a primeira parte dessa longa viagem em busca de tratamento funcionou. No HC seuVidal foi medicado, fez exames e recebeu o diagnóstico de câncer nos pulmões. “O médico disse que ele precisa fazer três anos de tratamento”, relatou dona Clemilda.
A partir do diagnóstico, começou a via sacra do casal. Hospedados de favor em casa de amigos na capital, a luta passou a ser conseguir realizar uma nova bateria de exames. Com várias marcações de retorno, o casal passou a viver entre a portaria do Hospital do Câncer e o taxi pago toda vez que precisa retornar. “Não temos mais dinheiro para ficar pagando taxi duas, três vezes por semana!”, desabafou Clemilda.
Apenas com a ajuda do TFD e o recurso do Bolsa Família, que recebe pelo cadastro de três filhos, que ficaram em Tarauacá, Clemilda chegou a confessar para a assistente social do Hospital do Câncer que pensa em desistir do tratamento do marido.
Com uma crise aguda de infecção intestinal, na última quinta-feira (20), o casal radicalizou e acampou em frente à portaria do Hospital do Câncer. A intenção era conseguir tratamento depois de uma tentativa frustrada de hidratação ao senhor Vidal feita no setor de emergência da unidade. “Só saímos daqui depois que conseguir internação”, dizia Clemilda.
O protesto do casal tem explicação. Ambiente alvoroçado, com excesso de pacientes e falta de leitos são alguns dos problemas do Hospital do Câncer em Rio Branco, alvo das principais críticas do setor de saúde do Estado.
Outra família também resolveu acampar em frente o Hospital pedindo internação e realização de exames. Diante da cena lastimável, a direção da unidade disse que os casos não eram de internação. Instantes após a presença da reportagem no local, os pacientes passaram a receber atendimento mais humanizado. Psicólogos e Casa de Apoio estão sendo providenciados.
A poucos metros dali, no jardim de um dos pavilhões da unidade, nossa equipe foi convidada a conhecer a situação de seu Pedro Marques de Souza, 67 anos. Depois de passar três anos se tratando na cidade de Barretos, em São Paulo, ele e a esposa, dona Maria do Carmo, resolveram voltar para Rio Branco atraídos pela propaganda de um hospital referência no tratamento de câncer no Brasil.
“Pensávamos que aqui teríamos mais condições, próximo de casa, da família. Mas nos deparamos com enormes dificuldades, não conseguimos durante esses sete meses realizar nenhum exame de colonoscopia – que detecta o câncer no intestino” reclamava dona Maria.
Sem se aguentar em pé devido à doença, Pedro foi auxiliado por funcionários da limpeza do Hospital que cederam um colchão de ar para ele se deitar enquanto esperava para ser atendido pela Dra. Nara. O paciente ficou deitado do lado de fora da unidade, exposto ao sol de 30º, aos olhos de enfermeiros, técnicos e da direção. O caso revoltou quem passava pelo local.
“Isso aqui é rotina nesse hospital, disse um dos funcionários que ajudou a ceder o colchão para seu Pedro”. Ele pediu para não ter seu nome revelado.
Providências
Depois do protesto de seu Vidal e da presença de nossa reportagem, providencias mais rápidas foram adotadas pela equipe de plantão. Enfermeiros levaram novamente o senhor Vidal para o setor de emergência. Após novas tentativas de acesso a veia, o paciente começou a ser hidratado. O serviço social tenta conseguir em Rio Branco uma vaga em uma das casas de apoio a pacientes em tratamento de câncer para abrigar seu Vida e a esposa.
O outro paciente, Pedro, que esperava do lado de fora da Unidade, passou a receber atendimento prioritário. Por telefone, a gerente em exercício do Hospital do Câncer, Paula Fabrícia, disse que seu Pedro foi atendido pela Dra. Nara, será internado amanhã(25) para fazer exame de colonoscopia na próxima sexta-feira (28).
Casos retratam uma triste realidade das famílias em tratamento de câncer no Acre.
Os casos do senhor Vidal e do senhor Pedro retratam uma triste realidade das famílias em tratamento de câncer no Acre. Dados estatísticos de dezembro de 2012 informam que 3.907 pacientes realizam tratamento no Hospital do Câncer. O Hospital tem capacidade de internação para 15 pacientes, cinco deles no setor de emergência.
Segundo a gerente da unidade em Rio Branco, Mirian Késia, 45% dos casos que chegam a unidade são através do Tratamento Fora de Domicílio (TFD). Quando acrescidos casos de pacientes de Roraima, Rondônia e Amazonas (do Brasil) e de pacientes da Bolívia e Peru (do exterior), a estatística avança.
“A maioria dos casos atendidos é do interior, essa semana mesmo vamos abrir porta para o tratamento de um paciente de Roraima por que Manaus não comporta mais a fila”, revelou Késia.
Conseguir vagas em uma das casas de apoio existentes em Rio Branco para quem vem do interior é outro dama. Elas estão sempre superlotadas. É o caso da família do senhor Vidal. Longe de casa e das três filhas menores, ele e a esposa não sabem como proceder para continuar o tratamento e garantir a continuidade da educação e assistência da família. Clemilda ainda reclama do risco de perder o Bolsa Família. Com atenção total dada ao marido, a vacinação das filhas está atrasada.
“Assim que tiver sinalizada uma condição de ficarmos aqui vou trazer minhas filhas para elas continuarem estudando, o problema é que as casas de apoio não recebem crianças dos pacientes”, disse dona Clemilda.
Oriundos da cidade de Tarauacá e do ramal Espinhara, de Sena Madureira, Vidal e Pedro, respectivamente, estão entre os pacientes em tratamento, mas com sérias dificuldades financeiras. Além disso, ainda lutam contra a autoestima baixa ao longo do tratamento.
“Ai nos deparamos com a fragilidade da doença com a falta de condições da família para bancar o tratamento. A necessidade é de um serviço social”, comenta Késia.
Há casos, como o do senhor Pedro, que tem encaminhamento para psicólogo. Por várias vezes após sair do colchão e ser encaminhado para a recepção do Hospital na tarde da última quinta-feira (20), seu Pedro gritou afirmando que a esposa, dona Maria do Carmo quer lhe matar. “Pedi imediatamente que o caso fosse encaminhado para uma psicóloga”, afirmou Késia.
Hospital no Acre ainda não é referência, mas já reduziu custos com TFD
O tratamento de 21 especialidades garantido pelo Hospital do Câncer em Rio Branco reduziu drasticamente o TFD. O governo do Acre gastava cerca de R$ 600 mil em passagens ao mês para levar pacientes em tratamento para outros estados.
A unidade reconhece os desafios existentes, entre eles, o de ampliar a assistência no diagnóstico precoce, criar a Agência de Combate ao Câncer e promover a descentralização com postos do HC no interior.
Por enquanto, o modelo idealizado pelo ex-governador Binho do Acre ser modelo em assistência, detecção e prevenção, ainda parece um sonho.
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